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O ADMINISTRADOR, A CARREIRA E A COGNIÇÃO

 

“Não pergunte se uma afirmação é verdadeira antes de saber o que ela significa”

Errett Bishop, matemático

 

“Mesmo quando tudo parece desabar, cabe a mim decidir entre rir ou chorar, ir ou ficar, desistir ou lutar; porque descobri, no caminho incerto da vida, que o mais importante é o decidir”

Cora Coralina - Escritora

 

Rogério Antonio Monteiro

Administrador, CRA 1013, Doutor em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

 

 

1. PROBLEMAS E OBJETIVOS       

 

No decorrer de nossas vidas somos muitas vezes aprisionados no labirinto da insatisfação com nossa carreira de administrador, na confusão do que precisamos saber para evoluir, no medo da contingência, na lesão da motivação, nas inseguranças com o mundo múltiplo e complexo, do medo de perder ser maior do que à vontade de ganhar.

 

A metáfora do labirinto representa tudo isto, um conjunto de percursos intrincados criados com a intenção de desorientar quem os percorre, constituído por estradas incertas e dificultosas para encontrar o caminho, sobretudo, a saída. Decerto que a entrada no labirinto ocorre devido ao acaso, na imprevisibilidade da vida. Porém, a saída precisa de controle, pensamentos e escolhas.

 

Com base na minha experiência de consultoria e de pesquisa proponho as seguintes hipóteses:

 

- 70% dos profissionais formados em administração têm baixa valorização por alguma limitação de saber técnico e comportamental;

 

- 25% são profissionais operacionais, exercendo uma especialização restrita;

 

- 5% são profissionais de excelência, com competência de estrategista e visão sistêmica do ambiente e da empresa, sobretudo com capacidade para direcionar e liderar a jornada de crescimento dos negócios.

 

A pesquisa abaixo, que expõe o mundo do trabalho e descreve temas como infelicidade, insatisfação, qualificação e duração das empresas, acentua as hipóteses e a metáfora do labirinto na carreira.

 

Quadro 1: Pesquisa sobre o mundo do trabalho

Fontes

Resultados das pesquisas

Instituto Isma (International Stress Management Association), julho 2023

72% das pessoas estão infelizes no trabalho.

FGV, janeiro 2024

Quase 50% dos profissionais demonstram insatisfação com o ambiente de trabalho.

Infojobs, dezembro 2022

84% das empresas têm dificuldade para contratar profissionais, a falta de qualificação é um grande desafio.

IBGE, 2021

Quase 80% das empresas brasileiras não duram dez anos.

 

A vida tem seu percurso, precisamos ir em frente, mas para onde caminhar neste labirinto congestionado? Assim, o objetivo do texto é o de buscar saídas do labirinto que nos aprisiona, sobretudo nas nossas carreiras, no mundo do trabalho. A proposta que defendo é de que os conhecimentos de administração nos fornecem um mapa cognitivo orientador para encontrar saídas no intricado labirinto, a fim de evoluir à nossa carreira ou na construção de competências para empreender.

 

A relevância do texto deriva da magnitude que envolve a formação do administrador. A evolução da carreira tem expressivo impacto na pessoa e na sociedade (segundo o IBGE, 80% das empresas não duram dez anos). O administrador é o catalizador da evolução das empresas, portanto, quem dá um norte à vida organizacional.   

Pensar a construção da carreira ou ação empreendedora nesse mundo confuso, acelerado e imprevisível, proponho como referência os conhecimentos de administração, que os represento como tecnologia cognitiva, fundamental para a reflexão, formulação e ação.

 

2. ADMINISTRAÇÃO E COGNIÇÃO

Ora, para achar caminhos precisamos de um mapa, uma referência para orientar a cognição, entendida à forma como os seres humanos percebem, interpretam e interagem com o mundo ao seu redor. É através da cognição que somos capazes de aprender, lembrar, pensar e resolver problemas técnicos e emocionais.

Porém, um aparte sobre cognição. Acreditava-se que os pensamentos conseguiam mudar nosso estado de espírito e nossas emoções, descobriu-se que o contrário também pode acontecer. Nosso estado de espírito e emoções podem mudar nossos pensamentos. Na prática, isso significa que momentos de tristeza ou alegria podem acabar se autoalimentando para criar pensamentos negativos ou positivos, definindo a maneira como vemos e interpretamos o mundo. Assim, emoção e cognição estão ligadas no processo de decisão.

Por conseguinte, precisamos atentar, por um lado, à condição importante da cognição que é a acomodação ou conforto cognitivo, entendido como uma vida ou situação sem grandes novidades, nenhuma necessidade de redirecionar a atenção ou de mobilizar esforços para a carreira ou saída do labirinto. A gente se acostuma com o hábito. Por outro lado, o esforço cognitivo é desconfortável, pensar dispende energia, gera tensão, um modo que exige empenho, foco e análise.

Nas empresas, a acomodação ou conforto cognitivo podem se manifestar via resistência à mudança. As empresas podem se tornar confortáveis com o estado atual e resistentes em adotar novas estratégias, tecnologias ou práticas de negócios, mesmo quando há evidências claras de que a mudança é necessária à adaptação e crescimento.

Além disso, o conforto cognitivo acomoda o sujeito no tempo, apegando obsessivamente a hábitos, evitando explorar novas abordagens e negligenciando a jornada. Isso limita o avanço na carreira e à inovação na empresa, dificulta a adaptação a novos desafios e oportunidades.

Quanto a Administração, precisa ser entendida como tecnologia cognitiva, codificada em modelos, métodos, ferramentas, técnicas, comportamentos e práticas, fundamental para compor o mapa da carreira, exercitar a caminhada. A Administração tem a finalidade de construir mapas para pensar e agir na carreira, pensar e agir na empresa, sobretudo na orientação para resultados.

Na minha caminhada encontro administradores, de várias idades e experiências, ávidos por um mapa que agregue valor à caminhada, aspirando estruturar as emoções, os pensamentos e orientar as ações, acolher saídas do labirinto.

Os mapas que sugiro no texto são escolhas feitas com base em três conjuntos de casos: o modelo de Charam e Yang, o modelo de Magaldi e Salibi e o modelo proposto no contexto de médias empresas.

 

3. MÉTODO: MODELO DE BUILDING BLOCKS (BLOCOS DE CONSTRUÇÃO) E ESTUDO DE CASOS

O método ou estratégia utilizado no texto tem como propósito contribuir para a reflexão e ação na carreira do administrador, portanto, ancorado no estudo de casos e nos building blocks.

O estudo de caso é uma estratégia de pesquisa científica que analisa um fenômeno atual em seu contexto real e as variáveis que o influenciam. Trata-se de um estudo intensivo e sistemático sobre organizações e comunidades, sobretudo de caráter qualitativo, que permite examinar fenômenos complexos, útil para entender o percurso das empresas.

Quanto ao building blocks ou blocos de construção são caracterizados por temas e enredos estratégicos. Responde à demanda por uma metodologia sistêmica, contribui para a análise holística da empresa, possibilitando a visão do todo. No modelo de Charam e Yang, a abordagem é sobre a Amazon. No modelo de Magaldi e Salibi são multicascos como Magalu, Mercado Livre, iFood etc. No modelo proposto no contexto de médias empresas são também multicascos, baseados na experiência de pesquisa e intervenção do autor.

A relevância do estudo de casos e dos building blocks aqui expostos, por um lado, apresentam um modo de análise de empresas em seu contexto, alinhado com a atualidade dos negócios, e por outro, fonte de informação imprescindível para orientar as carreiras e proporcionar ao administrador um modelo multidisciplinar imprescindível para estruturar competências cognitivas, conforme o quadro 2.

Quadro 2: Resumo dos Building Blocks (Blocos de Construção): os Temas Estratégicos dos Casos

MODELO DE CHARAM E YANG

Caso AMAZON

MODELO DE MAGALDI E SABILI

Multicasos

MODELO PROPOSTO

Multicasos

1. Modelo de negócios obcecado pelo cliente

1. Estratégia adaptativa/inovação constante

1. Estratégia adaptativa e generativa

Detalhamento da Estratégia em termos operacionais

2. Aumento contínuo do nível de exigência de talento

2. Custumer centricity

2. Perspectiva financeira

3. Sistema movido por dados e métricas gerados por IA

3. Agilidade

3. Liderança e cultura organizacional

4. Máquina de invenções inovadoras

4. Gestão baseada em dados

4. Foco nos clientes e em marketing e vendas

5. Decisões em alta velocidade e de alta qualidade

5. Cultura organizacional

5. Sistema de informação para inferências e tomada de decisão

6. Cultura do eterno Dia 1

6. Liderança

6. Processos ágeis de clientes, mercados, inovação e regulação

4. O MODELO DE CHARAM E YANG

Para Charam e Yang, no futuro todas as empresas serão digitais. Consideram que a abordagem de gestão centenária, baseada na supervisão pessoal, “o ficar de olho nos colaboradores”, sustentada pelo comando e controle, se tornou obsoleta com a Internet, smartphones, big data, algoritmos e inteligência artificial.

Em vez do administrador “ocupar grande parte do seu tempo supervisionando e avaliando os outros, realizando reuniões e comitês sem-fim, seu trabalho agora será estudar os clientes diretamente e criar inovação contínua para eles. Seu trabalho exigirá aprender como gerenciar, sobretudo, as operações do dia a dia ao usar dados e métricas com ferramentas digitais para afinar suas opiniões e tomar decisões”.

Os autores usam temas que indicam o importante papel do administrador em relação à necessidade da imaginação para reinventar a empresa. Valorizam o sistema de gerenciamento, o uso de ferramentas digitais e acima de tudo, as competências para liderar a transformação.

No livro “O sistema Amazon”, Charam e Yang consideram que o sistema da empresa foi desenhado para velocidade, agilidade e escala. Caracterizam os building blocks em seis fundamentos, conforme o quadro 3, descrito na íntegra.

Quadro 3: Modelo de Charam e Yang (Referência 1)

FUNDAMENTOS

O CASO AMAZON

1. Modelo de negócios obcecado pelo cliente

Plataforma on-line e off-line, provedor de ecossistema e infraestrutura.

Ideia central baseada em obsessão pelo cliente, inventar em nome do cliente, pensamento de longo prazo e geração de caixa sobre ganhos.

2. Aumento contínuo do nível de exigência de talento

Definição: construtor, proprietário e resistência mental.

Recrutamento: levantador de patamar, processo rigoroso e mecanismo autosseletivo.

Motivação: terra dos sonhos do construtor, paraíso do jovem e altos padrões.

3. Sistema movido por dados e métricas gerados por IA

Fonte única de verdade.

Métrica: ultradetalhado, ponta-a-ponta, em tempo real, acompanhando entradas e necessidade de verificação e ser encaminhado para o proprietário específico da medida.

Ferramentas poderosas movidas por IA capazes de automatizar a tomada de decisão.

4. Máquina de invenções inovadoras

Motivação implacável para inventar: ousando aprender novas habilidades, acabar com seu próprio negócio, fracassar seriamente.

Buscar e construir grandes ideias continuamente (o comunicado de imprensa), e construir, em tempo integral, times interfuncionais e com localização compartilhada “de duas pizzas” com o líder de projeto certo.

5. Decisões em alta velocidade e de alta qualidade

Dois tipos de tomada de decisão: Tipo 1(portas de mão única) e Tipo 2 (portas de mão dupla). Para decisões do Tipo 2, velocidade importa. Deixe o dono da métrica tomar a decisão. Se a aprovação for necessária, apenas um nível.

Para decisões do Tipo 1, concentre-se em poucas. Encontre a melhor verdade, imagine a mudança possível, combata o pensamento manada, e, ao se deparar com discordância, discorde e se comprometa.

Para aumentar a escala de boa tomada de decisão, você precisa esclarecer princípios e metodologias consistentes (as narrativas de seis páginas) e reforçá-los em cada decisão.

6. Cultura do eterno Dia 1

Para se proteger do Dia 2: verdadeira obsessão pelo cliente, resista a aproximações, acolha tendências externas, tome decisões rápidas, lute contra a complacência, mate a burocracia e aproprie-se de fraquezas.

Para criar uma cultura do eterno Dia 1: operacionalize por meio de comportamentos observáveis, crie mecanismos de imposição, viva e respire você mesmo os princípios e invente símbolos e recompensas memoráveis.

 

Observação 1: O propósito da observação é o de explicar quatro expressões.

Na perspectiva dos autores, na Amazon, a velocidade é a principal prioridade no processo de tomada de decisão. Para esse propósito, a empresa categorizou as decisões como dois tipos diferentes: do tipo 1 ou tipo 2.

a) A tomada de decisão do tipo 1: as decisões do tipo 1 são àquelas que geram consequências irreversíveis, explicitada na metáfora da porta – “portas de mão única ...Se você entrar e não gostar do que vê do outro lado, não consegue voltar para onde estava antes”.

As decisões do tipo 1, devido as implicações de longo prazo, devem passar por um processo metódico, elaborado, com cuidado, devagar e com grande deliberação. Pode impactar o futuro da empresa.

b) A tomada de decisão do tipo 2: as decisões do tipo 2 se referem àquelas que podem ser tomadas rapidamente por indivíduos ou pequenos grupos, são modificáveis e reversíveis: são “portas de mão dupla. Se você tomou uma decisão mediana do tipo 2, não precisa viver com as consequências por tanto tempo. Você pode reabrir a porta e voltar”.

c) As narrativas de seis páginas: escrever narrativas de seis páginas força o autor a conduzir uma análise completa, distinguir situações tênues, articular a lógica interna, estabelecer prioridades para várias ideias. A narrativa de seis páginas força melhor o pensamento e entendimento do que é mais importante e articula sua relação.

d) Cultura do eterno dia 1: a explicação do dia 1 advém do fato de que normalmente o negócio cresce, a complexidade e as camadas aumentam e geram lentidão, rigidez e aversão ao risco.

Por isso, o compromisso de estar eternamente no Dia 1, isso quer dizer “combinar as vantagens de tamanho e escala de uma grande empresa, a velocidade e agilidade de uma startup e as atualizações contínuas de capacidade organizacionais”.

 

5. O MODELO DE MAGALDI E SALIBI

Para Magaldi e Salibi, as jornadas de empresas que estão dominando o mundo empresarial são de natureza muito diferente das empresas tradicionais – da pré-era digital. Consideram que muitos estudos de casos que costumamos acessar já não retratam a realidade atual.

Nesse sentido, tal como Charan e Yang, seus casos, expresso no livro “Estudo de Casos – Gestão do Amanhã”, indicam características de empresas da nova economia como velocidade, agilidade, escala, cultura, sistema de gerenciamento e vendas usando ferramentas digitais, tendo como objetivo liderar a transformação.

O ponto forte do livro de Magaldi e Salibi está em organizar as categorias dos building blocks, propor um modo de fazer análise, um modo para interpretar casos de empresas, assim fornece uma contribuição ao aprendizado de Administração, sobretudo nas práticas das novas empresas que estão mudando o mundo.

As empresas selecionadas no estudo de casos são Magalu, Mercado Livre, iFood, Nubank, Best Buy e Domino’s Pizza. Segue abaixo, na íntegra, o método dos building blocks usado para analisar os casos em referência.

Quadro 4: Modelo de Magaldi e Salibi (Referência 2)

FUNDAMENTOS

DETALHAMENTO DOS BUILDING BLOCKS - MULTICASOS

1. Estratégia adaptativa/inovação constante

Esse Building Block tem como foco analisar como a estratégia da organização e seu sistema de gestão se relacionam com a inovação constante em seu negócio. Serão apresentadas e analisadas as evidências das principais inovações geradas pela empresa ao longo de sua trajetória (explorando temas como Motor 2 de crescimento, inovações disruptivas etc.)

2. Custumer centricity

Nesse Building Block, será explorado como a organização adota a filosofia Customer Centricity, apresentando iniciativas e evidências concretas de como ela coloca o cliente no centro da sua jornada de criação de valor.

3. Agilidade

Nesse Building Block, por sua vez, serão exploradas as evidências de como a agilidade faz parte da estratégia da organização e de seu sistema de gestão. Será analisado se o processo decisório da organização é rápido e assertivo e quais são os métodos de gestão adotados para atingir esse objetivo.

4. Gestão baseada em dados

Esse Building Block apresentará como o sistema de gestão de informações da companhia impacta o seu negócio, analisando os elementos e tecnologias adotadas nessa estrutura. Também será explorado como esse sistema impacta no processo decisório e na evolução das iniciativas da empresa.

5. Cultura organizacional

Já nesse Building Blocks, serão analisados os elementos presente na cultura da organização, explorando os impactos desse sistema na empresa em relação à forma como o trabalho evolui naquele contexto e os impactos para o negócio.

6. Liderança

Esse Building Block contará com a análise do modelo de liderança adotado pela organização e o sistema de gestão de pessoas da companhia, bem como suas práticas de atração, retenção e desenvolvimento de talentos.

 

Observação 2: O propósito da observação é o de explicar as expressões motor 1 e motor 2 de crescimento.

Os dois modelos, motor 1 e 2, demandam abordagens distintas muito específicas. No motor 1, envolvem acentuada disciplina para a melhoria contínua dos processos e monitoramento constante na redução de riscos da operação, sobretudo os financeiros. O foco está na operação atual.

No motor 2, são requeridos uma gestão baseada na agilidade, maior inclinação ao risco, originalidade, singularidade e uma estrutura financeira especifica. O motor de crescimento 2 tem foco no futuro, na criação de um negócio mais apto a catalisar as novas demandas dos clientes, atento às ameaças e oportunidades da nova economia.

 

6. MODELO PROPOSTO NO CONTEXTO DE MÉDIAS EMPRESAS

Os modelos de Charam e Yang e de Magaldi e Salibi têm o objetivo de apresentar um método para analisar e descrever a realidade de grandes empresas, sobretudo da nova economia.

O modelo proposto nasce de pesquisa e intervenção que realizo em médias empresas e tem a finalidade de descrever e contextualizar a realidade que vivo e propor um modelo para que os administradores pensem à sua carreira e à intervenção nas empresas. Para compor o modelo, utilizei o mesmo critério de estudo de casos e blocos de construção (building blocks).

No entanto, apresento os blocos de construção e detalhamento dos temas estratégicos em duas partes:

Na parte 1, no início do processo de análise e intervenção, as médias empresas apresentam grandes desafios, marcados como pontos fortes e fracos, de acordo com o quadro 5. A interpretação dos desafios relaciona-se a média dos desafios enfrentados pelas empresas para trilhar caminhos em busca de resultados. Acredito que a minha experiência seja comum à de muitos administradores.

A parte 2 sustenta-se na composição dos blocos de construção, com apoio de perguntas estruturadas a fim de analisar e abraçar a criação de estratégias nas empresas. São perguntas com base na pesquisa sobre os pontos fortes e fracos das empresas e tem o sentido de avançar na organização de informações para iluminar o plano de intervenção, conforme quadro 6.

Quadro 5: Pesquisa sobre desafios em médias empresas (início do processo de intervenção)

DESAFIOS

DETALHAMENTO

Sobre a Estratégia

-Esforço intenso de 40% das empresas para gerar consistência no sistema de gestão: entender e fortalecer os pontos fortes e entender e melhorar os pontos fracos.

-40% das empresas com potencial para desenvolver novos clientes e mercados.

Detalhamento da Estratégia

-Baixa incidência de empresas que formaliza a estratégia em Mapa Estratégico e detalha a jornada da estratégia em projetos.

Sobre liderança e cultura

-Modelo mental fixo e de crescimento. 50% das lideranças querem manter a situação atual (fixo) e 50% desejam mudanças (crescimento).

-Em várias empresas as lideranças consideram as pessoas e o conhecimento como secundário.

-Apenas 30% das lideranças têm visão compatível com a base de recursos da empresa.

Informação e tomada de decisão

 

-60% das empresas o processo de tomada de decisão é baseado em julgamentos rápidos, intuição e emoções.

-Estas empresas carecem de demonstrativos de resultados econômicos e financeiros, métricas de processos etc.

-65% têm uso limitado da tecnologia da informação.

Clientes e mercado - práticas

 

- 40% das empresas têm a crença em agregar valor ao cliente.

-Apenas 30% das empresas desenvolvem processos e métricas de clientes.

-40% das empresas com potencial para desenvolver novos produtos, novos clientes e mercados.

Processos de negócios: agilidade, inovação e regulatório

-Sobre agilidade: apenas 30% das empresas estão automatizando processos.

-Necessidade de avanços na inovação de mentalidades.

-No geral, as empresas estão buscando se alinhar aos processos regulatórios.

 

Observação 3: O propósito da observação é o de explicar as expressões modelo mental fixo e de crescimento (referência 8).

 

a) Modelo mental fixo: de acordo com Carol Dweck em sua obra “Mindset”, o modelo mental fixo refere-se a características do sujeito com necessidade constante de provar a si mesmo seu valor, medo de assumir riscos na tomada de decisão, sentimento de fracasso e paralisia diante de problemas e baixa capacidade para identificar seus pontos fortes e fracos. Normalmente, são líderes com dificuldades em entender os problemas e construir soluções consistentes. Valorizam apenas as suas capacidades e adoram ouvir falas lisonjeiras sobre si.

 

b) Modelo mental de crescimento: decerto que um grande desafio da inovação em empresas é a mudança de mentalidades.

 

No modelo mental de crescimento, a liderança cerca-se das pessoas mais capazes, enfrenta diretamente seus próprios erros e deficiências, procura saber com franqueza quais as qualificações de que eles mesmos e suas empresas necessitarão no futuro. Por causa disso, podem progredir com uma confiança baseada em fatos e não como resultado de fantasias a respeito de si.

 

Esse estilo de liderança com base no crescimento constrói competências para enfrentar desafios e situações negativas, lida com a angústia, a dor e a contradição – marca inevitável da arte de viver.

 

Retomando a parte 2, na prática as empresas que evoluem são aquelas dispostas a construir cultura da estratégia, mudar mentalidades das lideranças, adaptar-se ao comportamento dos clientes, gerar singularidades no portfólio para ter margens ampliadas, contar com sistemas de gerenciamento para apoio as decisões e articular processos ágeis de negócios. Enfim, segue os blocos de construção, com perguntas estruturadas do modelo proposto.

 

Quadro 6: Modelo proposto no contexto de médias empresas

FUNDAMENTOS

DETALHAMENTO DOS BUILDING BLOCKS - MULTICASOS

 

1. Estratégia adaptativa e generativa

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1.1. Detalhamento da Estratégia em termos operacionais

 

O bloco de construção em foco busca avaliar a capacidade da empresa em desenvolver estratégia adaptativa, isto é, ter consciência das suas próprias capacidades de se movimentar, conhecer os pontos fortes e fracos e mapear o ambiente – pontos fortes desenvolvidos, pontos fracos corrigidos.

 

Também, busca-se entender a capacidade para a estratégia generativa, no sentido de obter uma nova percepção original e singular sobre onde o ambiente de negócio irá no futuro, numa área em que os pontos fortes da empresa possam ser utilizados no desenvolvimento de clientes, produtos e mercados.

 

Temas para construção de inferências e intervenção

 

-Qual é a real situação no presente?

O modelo mental da liderança é de crescimento ou fixo?

Qual é a lucratividade e fluxo de caixa?

Há consistência no sistema de gestão e no valor do portfólio?

Sobre clientes: qual o trabalho a fazer?

 

-Onde queremos estar no futuro?

Quais são os cenários e oportunidades?

Há coerência do posicionamento futuro com a base de recursos e conhecimentos?

 

-Como fazer para chegar lá?

Como inovar o portfólio para ampliar clientes e mercados?

Como está o comprometimento das pessoas nos projetos?

 

O bloco de construção em foco visa analisar o detalhamento da estratégia em termos operacionais.

 

-Como acontece a tradução da estratégia em termos operacionais na empresa: mapa estratégico (síntese da visão de futuro), projetos e métricas?

 

-Como a empresa comunica a estratégia: interno e externo?

 

-A empresa avalia a estratégia e as operações mediante reuniões periódicas?

 

-Como funciona o sistema de monitoramento?

2. Perspectiva financeira

O bloco de construção em foco visa analisar a perspectiva financeira e econômica da empresa, busca desenvolver demonstrativo de resultados financeiros e econômicos e capital de giro para evidenciar os resultados da empresa, monitorar o crescimento e subsidiar a ferramenta de precificação de produtos e serviços.

 

Temas para construção de inferências e intervenção

 

-Qual é a prática da empresa em relação a:

 

-Análise da curva ABC de produtos e clientes e perfis de lucratividade para atuação e ampliação de nichos lucrativos.

 

-Organização dos custos fixos e variáveis, diretos e indiretos e pela cadeia de valor dos produtos.

 

-Organização das receitas e despesas em categorias de resultados para análise de resultado financeiro e econômico – DRE: Demonstrativo de Resultados Econômicos, capital de giro e orçamento.

 

-Estruturação e capacitação para registro dos custos e despesas na origem, por produto, linha de produtos etc., bem como por centros de custos e naturezas financeiras.

 

-Elaboração de precificação de produtos para clareza e consistência das margens de lucro (margem bruta, lucro líquido e EBITDA), seja por pedido ou por produto.

 

-Análise da viabilidade de investimentos.

3. Liderança e cultura organizacional

O presente bloco de construção tem como foco analisar o modelo de liderança e cultura adotado nas empresas.

 

Temas para construção de inferências e intervenção

 

-Identificar o comportamento das lideranças via modelo mental de crescimento ou modelo mental fixo?

 

-Qual é a estrutura emocional da liderança na condução da estratégia e do trabalho em equipe?

 

-A realidade é sempre diferente da expectativa, portanto, o comportamento pode ser modificado?

 

-Como é a relação entre o medo de perder e a vontade de ganhar?

 

-Como a liderança toma decisão: com base no Sistema 1 (emoções ou julgamentos precipitados) ou Sistema 2 (a razão e a informação)? (Referência 3)

 

-A liderança tem preparo para a conversação estratégica ancorada em informações?

 

-Como são as crenças da empresa em relação aos clientes, as pessoas, a formação do conhecimento, em relação ao lucro e ao meio ambiente.

 

-A cultura da empresa forma talentos?

4. Foco nos clientes e em marketing e vendas

O presente bloco de construção visa analisar como a empresa foca no cliente e como são estruturadas as estratégias de marketing e vendas.

 

Temas para construção de inferências e intervenção

 

-Há na empresa sistemas de gestão de clientes?

 

-Como é a estrutura de precificação para os clientes?

 

-A empresa está atenta a novos produtos para clientes atuais e novos clientes? Analisa os mercados de atuação e potenciais fronteiras para ampliação de negócios?

 

-Como está estruturado os processos organizacionais de vendas e marketing? Como combinam para vender?

 

-Como é composta a força de vendas: redes de representantes, vendas internas diretas e vendas on-line?

 

-Como é o processo de vendas: prospecção, leads, oportunidades e conversão? A empresa tem especialização na prospecção: ter profissionais nesta área focado em fazer a prospecção para vendas?

 

-Qual é a prática das métricas de vendas? 

5. Sistema de informação para inferências e tomada de decisão

Esse bloco de construção visa analisar o conjunto do sistema de informação, o processo operacional de registro, a qualidade dos dados para análise e tomada de decisão.

 

Temas para construção de inferências e intervenção

 

-Há na empresa sintomas críticos como fragilidade das informações gerencias sobre clientes, lucratividade, fluxo de caixa, orçamentos e processos?

 

-Como é a prática no uso do sistema de informação e o processo de estruturação dos dados?

 

-Como as informações dão suporte à decisão da jornada estratégica, sobretudo a conversação estratégia e operacional?

6. Processos ágeis de clientes, mercados, inovação e regulação

O presente bloco de construção visa entender como a agilidade faz parte da estratégia e dos processos da empresa.

 

-Os dados de processos de clientes, mercados e regulação estão disponíveis em tempo real para a tomada de decisão?

 

-Os processos da empresa contribuem para minimizar desperdícios de recursos, tempo e esforços, visando à eficiência e à otimização?

 

-Os processos têm foco em fornecer produtos ou serviços de alta qualidade e valor, priorizando a satisfação de clientes?

 

 

Observação 4: O propósito da observação é o de explicar as expressões Sistema 1 e Sistema 2. (Referência 3)

 

a) O Sistema 1: em muitas empresas, o processo principal de tomada de decisão ou escolha é baseado em sentimentos, intuição, egos e julgamentos precipitados. Isto é caraterizado por Kahneman como Sistema 1, um modo de pensamento que opera de forma rápida, automática e intuitiva, influenciada por julgamentos comandados pela emoção. Nesse sentido, a mente do empresário pode se assemelhar a uma máquina para tirar conclusões precipitadas e exposta a influências emocionais que podem minar a capacidade de julgar e agir com clareza.

b) O Sistema 2: Kahneman denomina de Sistema 2, o modo de pensamento racional que demanda informação para analisar a empresa e o contexto, que exige concentração nas conversações, que opera com uma série ordenada de cálculos e passos na execução das atividades. No Sistema 2, o processo decisório precisa ser apoiado por demonstrativos, orçamentos, mapas cognitivos, conversação embasada e outros.

 

7. CONCLUSÃO

 

O texto busca mostrar a importância dos modelos, métodos e ferramentas de Administração para a produção de MAPAS, a fim de refletir a carreira e lidar com o labirinto que nos aprisiona. Assim, os conhecimentos de Administração apresentam-se como uma boa oportunidade para provocar e estruturar a reflexão sobre a sua prática de vida e estimular a cognição.

 

Desejo que os mapas sejam a minha contribuição ao administrador. Mas, por que escolhi três conjuntos de casos e o método dos building blocks?  O propósito, que envolve desejo e esperança, é colaborar para dar um norte à carreira, ajudar o administrador ao lidar com um quebra-cabeça complexo evite que a visão fique limitada as pecinhas soltas, mas que tenha uma visão sistêmica, um todo articulado.

 

Sobre o método, não quis pesquisar textos que fazem críticas às empresas em foco. A busca foi por modelos e temas que ajudem a interpretar a realidade da empresa. O ponto forte do modelo de Charan e Yang é o de detalhar os temas estratégicos da Amazon. O modelo de Magaldi e Salibi fornece conteúdo sobre o que analisar na empresa. O modelo proposto fornece perguntas para estruturar as informações e apoiar a intervenção.

 

No modelo proposto, os conhecimentos de administração estão referenciados na ciência, na prática, em situações vividas e contextualizadas no segmento de médias empresas. Como “a cultura come a estratégia”, por conseguinte, a estratégia tende a funcionar para certas situações e não em outras, então usá-la é uma escolha que demanda texto e contexto.

 

No mundo contemporâneo a riqueza da sociedade depende da ciência, sobretudo da ciência da Administração. O ato de pensar e aprender Administração para evolução do conhecimento e da carreira, tem expressivo impacto na pessoa e na sociedade. O administrador é o catalizador da evolução das empresas, portanto, precisa ter atenção ao fato de que 80% das empresas duram 10 anos.

 

Nesse sentido, a educação e a tecnologia tendem a exacerbar a diferença entre aqueles que têm e aqueles que não tem capacidade, sobretudo a de aprender. O aprender costuma ser o principal obstáculo na transição para a evolução da carreira.

Em suma, é evidente que aprender não é uma tarefa trivial, aprender demanda certo desconforto cognitivo, mas precisamos reconhecer o prazer que gera quando a mente se expande. Acredito, no meu efêmero tempo, que viver melhor é pensar melhor.

 

REFERÊNCIAS

1. CHARAN, Ram, Julia Yang. O sistema Amazon. SP: Planeta, 2020.

2. MAGALDI, Sandro, José Salibi Neto. Estudo de Casos – Gestão do Amanhã. Barueri, SP: Camelot, 2021.

3.  KAHNEMAN, Daniel. Rápido e devagar - duas formas de pensar. RJ: Objetiva, 2012.

4. Van Der HEIJDEN, Kees. Planejamento por cenários: a arte da conversação estratégica. Porto Alegre: Bookman, 2009.

5. HOLIDAY, Ryan. O ego é seu inimigo. RJ: Intrínseca, 2017.

6. LONGO, Walter. Vítimas do critério. RJ: Alta Books, 2021.

7. YOUNG, Scott. Ultra-aprendizado. RJ: Harper Collins, 2020.

8. DWECK, Carol. Mindset: A nova psicologia do sucesso. SP: Objetiva, 2017.

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